Como não pensar em conchas quando se fala de praia? Como não se encantar com as diversas formas e cores que possuem? Querer levar um pedacinho de um lugar para casa pode parecer uma boa lembrança, porém traz consequências a longo prazo para o ecossistema.
Qual a importância das conchas e do que são feitas:
As conchas estão presentes na maioria dos moluscos marinhos externamente, como nas ostras, ou internamente, como nas lulas; e possuem a função de sustentar e proteger esses animais, que possuem o corpo mole. Tomaremos como exemplo o mexilhão Mytilus edulis. Desde a fase larval até a fase adulta, a alimentação permite ao organismo retirar do mar substâncias essenciais para sua formação e desenvolvimento. Uma dessas importantes substâncias é o carbonato de cálcio que, ao ser gradativamente secretado e liberado pelo manto (tecido epidérmico), forma a concha do mexilhão.
Com a morte de animais como o mexilhão, sua concha se deposita no fundo do mar é decomposta por alguns microrganismos e progressivamente degradada, disponibilizando novamente o cálcio no meio ambiente para ser utilizado por outros animais ou formações calcárias, e até mesmo compor parte do sedimento das praias. Essa sequência é chamada de ciclo do cálcio, um ciclo biogeoquímico de extrema importância aos ecossistemas, pois possibilita a reciclagem de elementos químicos no meio ambiente.
A consequência da retirada de conchas
Mesmo após a morte do animal, as conchas ainda podem ser facilmente encontradas na praia de forma íntegra. Isso acontece porque o carbonato de cálcio confere rigidez e resistência à estrutura, podendo preservar suas formas e cores, que chamam a atenção principalmente dos turistas. Muitas vezes, os visitantes optam por levar o material como forma de lembrança, seja in natura ou em artesanatos.
No entanto, a retirada em grande escala pode gerar grandes impactos ao ambiente marinho que é especialmente sensível, como a queda da disponibilidade de cálcio. Essa alteração impacta até mesmo os moluscos que não fabricam as próprias conchas. As muitas espécies de ermitões, crustáceos pertencentes à Ordem Decapoda, utilizam conchas desocupadas de gastrópodes para se proteger, criando para si um microambiente úmido. Conforme seu crescimento, a concha ocupada torna-se pequena demais para abrigar o ermitão, exigindo que seja substituída por uma concha maior.
Se não há conchas disponíveis no ambiente, essa troca não será possível, o que deixa o animal vulnerável em seu próprio habitat, ameaçando sua sobrevivência. Dessa forma, aumentam as disputas entre as espécies por abrigos calcários e isso pode ter um alto custo, onde um ermitão depende da interação com o lixo para se abrigar, podendo utilizar uma lata de metal no lugar da concha.
A consequência do excesso não natural de conchas
Tratando-se de conchas e reciclagem de nutrientes, não só a diminuição do estoque calcário causa impactos ecossistêmicos. Em circunstâncias específicas, como na maricultura, o descarte excessivo de conchas também causa sérios danos ambientais. O cultivo de organismos marinhos, ou maricultura, é uma atividade amplamente praticada no Brasil. Nossos ricos litorais possibilitam o cultivo em larga escala em fazendas marinhas, importante para gerar rendas principais ou alternativas, assim como alimentação para a comunidade local.
O estado de Santa Catarina é um dos maiores produtores de ostras e mariscos do Brasil, responsável por 95% da produção nacional. Tamanha atividade gera uma grande quantidade de resíduos, que são descartados massivamente e de forma não natural na etapa de limpeza dos organismos para a venda ou posterior ao consumo, como as conchas.
A consequência do descarte inadequado de toneladas de conchas nas praias é a eutrofização, que consiste no grande aporte de substâncias orgânicas nas águas. Esse excesso de cálcio despejado no ambiente não é absorvido de forma natural e causa o assoreamento, que é o acúmulo de sedimentos no ambiente marinho. Tamanhos impactos alteram profundamente a qualidade da água e prejudicam o funcionamento de todo o ecossistema.
Então, qual a melhor forma de levar recordações do ambiente e preservá-lo ao mesmo tempo:
Levando em conta a origem antrópica desses impactos, a educação ambiental torna-se uma das principais ferramentas para a conscientização da população e resolução de problemas ambientais. A troca de informações e a adoção de ações conscientes permitem que os seres humanos desenvolvam ideias e práticas para uma convivência harmônica e sustentável com o meio ambiente. Como, por exemplo, não retirar as conchas da praia ou destinar para a reciclagem os resíduos oriundos do cultivo de ostras, que serão utilizados na fabricação de ração animal, correção de acidez do solo e na indústria farmacêutica.
Pequenas ações geram grandes resultados. Apenas admirar o ambiente como ele é também é uma forma de preservá-lo! Afinal, as fotografias e vídeos têm o poder de eternizar momentos e também são lindas formas de lembranças.
Autores deste post: Fernanda Cabral Jeronimo, Raphaela A. Duarte Silveira, Thais R. Semprebom e Douglas F. Peiró
Fontes de Informações:
https://www.bioicos.com.br/post/o-papel-das-conchas-no-ambiente-marinho
https://www.bioicos.com.br/artigos
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