Com o desaparecimento dos Tupinambás, a comunidade indígena em Ubatuba hoje é representada por tribos que migraram para a região, de origem Tupi-Guarani e Guarani. São duas Aldeias em Ubatuba, a Renascer e a Boa Vista, que mesmo tendo seu território garantido, enfrentam sérios problemas para assegurar sua sobrevivência e o modo de vida tradicional. Neste contexto, o desenvolvimento de alternativas para geração de renda de forma sustentável é um dos desafios prioritários dos indígenas de nossa região.
A caça, que era uma das principais fontes de alimentação nas Aldeias de Ubatuba, já não é tão abundante na região. Ao mesmo tempo, o contato com os juruás (não índios), também introduziu nas tribos o consumo de alimentos industrializados e produtos como roupas e supérfluos. Para sobreviver de acordo com o novo modo de vida, os índios se tornam cada vez mais dependentes do dinheiro. Um dos desafios prioritários aos povos indígenas é o desenvolvimento de alternativas para a geração de renda de forma sustentável, e que ao mesmo tempo, ajudem a preservar a tradição cultural nas aldeias.
Aldeia Boa Vista
A Aldeia Boa Vista é habitada pelo povo indígena Guarani Mbya (*), que, além de ocupar terras em outras regiões do Estado de São Paulo, possui comunidades no Espírito Santo, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul. O povo Guarani também está presente na Argentina, no Paraguai, no Uruguai e na Bolívia.
O acesso à Aldeia Boa Vista é pela Rodovia Rio-Santos (BR-101), Km 29,5, sentido Ubatuba-Paraty, cerca de 500 metros antes da Cachoeira do Prumirim. A entrada para a aldeia está localizada a 1,5 Km da rodovia, e o caminho é feito por estrada íngreme de terra até a antiga Escola Estadual Indígena. Algumas famílias indígenas moram ao lado desta “escola”, mas o acesso à tribo tem que ser por trilha, uma caminhada de 7 a 8 minutos pela Mata Atlântica. A aldeia conta com uma área de 920,66 hectares, aproximadamente 40 famílias e 200 índios (dados de 2014), sendo a língua oficial da tribo o Guarani. Uma grande atração natural que encontra-se nas terras desta aldeia, são as águas que formam a bela Cachoeira da Boa Vista, e que mais abaixo, descendo a Serra do Mar vão formar a Cachoeira do Prumirim.
A terra indígena está localizada em área de Mata Atlântica, o que é fundamental para os Guaranis, e na visão deles, um bom “Tekoa” (expressão para denominar o local onde é possível realizar o modo de ser Guarani) deve estar próximo da floresta. Em 1982 iniciou-se o processo de reconhecimento e demarcação das terras indígenas no Estado de São Paulo, inclusive o a da Aldeia Boa Vista em 1987, que foi, finalmente, homologada.
Sua origem deu-se no Paraguai e Argentina, de onde migraram para o Paraná, mais tarde sendo trazidos para Paraty antes da chegada à Ubatuba. Na Aldeia Boa Vista da Nação Guarani foram implantadas, sem perder as raízes indígenas e identidade com seus antepassados, a escola “Tembiguai” (Mensageiro) mantida pela prefeitura, onde os alunos de 1ª e 2ª séries aprendem sua língua de origem, o “guarani-mbya” e os de 3ª e 4ª séries recebem aulas em português. A aldeia conta com placas solares para a captação de energia, fossa séptica, telefone comunitário e posto de saúde, permitindo que a comunidade controle doenças como a gripe e verminose, baixando também a taxa de mortalidade infantil.
Artesanato
O artesanato é confeccionado há séculos pelo povo Guarani, são objetos que tradicionalmente eram usados no dia-a-dia e nos rituais desse povo. Atualmente, a comercialização do artesanato é a principal atividade geradora de renda da comunidade Guarani. Esse foi o meio encontrado pelos Guaranis para inserir-se na sociedade de mercado e, simultaneamente, fortalecer sua cultura, num processo que conjuga diálogo e resistência. Essa atividade envolve homens e mulheres, de diversas idades, que são responsáveis pela confecção de uma variedade de peças artesanais: cestarias, instrumentos musicais, esculturas de madeira, pau-de-chuva e adornos.
A Casa de Artesanato dentro da tribo reúne informações de produtos artesanais, com enfoque em matérias primas, meios de confecção e modelos da fabricação artesanal. O processo de produção do artesanato envolve a coleta da matéria-prima na mata, sua preparação (corte, secagem, tingimento) e a confecção das peças. Dependendo do tipo de artesanato, esse processo pode levar dias ou semanas. Encontramos basicamente artesanatos populares como: abanos, colares, filtro do sonho, armas, cestos balaio, cestas com tampa e instrumentos musicais. Utilizam, como matéria prima, sempre preservando-se as matrizes, as fibras de taquara lixa, cajarana, cipó-imbé, pedra, brejaúva, embira, bambú, pati, cabaça, guapuruvu, jenipapo, caxeta, penas e sementes. Há também o cuidado de aproveitar ao máximo cada matéria-prima coletada, evitando desperdícios.
Na aldeia Boa Vista, a cestaria é o tipo de artesanato produzido em maior quantidade, as peças são confeccionadas com esmero, precisão nos grafismos geométricos e delicadeza no corte milimétrico das tiras de taquara. Os grafismos são variados, diferentes de um artesão para outro, mantendo, no entanto, uma relativa homogeneidade nas formas, cores e estilos. Os artesãos da comunidade também produzem esteiras, leques, adornos (colares, pulseiras e anéis), instrumentos musicais (chocalhos, paus-de-chuva e tambores), utensílios (arcos e flechas, zarabatanas e machadinhas) e miniaturas em madeira representando animais da Mata Atlântica.
Aldeia Boa Vista – Contato: https://www.facebook.com/Aldeia-Boa-Vista-1415756545341063/
Rituais
Os rituais indígenas ainda são mantidos, assim como o artesanato e a música. Em fevereiro de 1999 foi lançado o CD “Ñande Reko Arandu” (Memória Viva Guarani) em parceria com outras três aldeias guaranis de São Paulo e do Rio de Janeiro, contendo canções infantis indígenas e de temas religiosos apoiadas no “xamanismo”. O coral indígena foi composto por 120 pessoas e músicos com seus instrumentos tradicionais como chocalho, violão de cinco cordas, rabeca de três cordas e tambor, e foi gravado em um estúdio móvel. Estes índios vivem de forma muito simples e formam uma comunidade unida, um povo tranquilo que vive em paz, que cultiva e mantém seus costumes e princípios. Os índios Guaranis têm muita fé e se reúnem todas as noites na Casa de Orações.
Os Guaranis foram considerados durante os séculos XVI e XVII pessoas dóceis, discípulos dos missionários, ou até mesmo como vítimas dos sanguinários bandeirantes. No fim do século XIX eles iniciaram o processo de migração para o litoral, sendo que, a Aldeia Boa Vista em Ubatuba surgiu no final da década de 60 com a chegada de três famílias trazidas para o Promirim por Octacílio Dias Lacerda, grande responsável pela história dos Guaranis na cidade. Por meio de uma estratégia montada por Lacerda, a Funai legitimou a posse da terra para os índios, e resgatou a dívida que Ubatuba tinha com os primeiros habitantes, os índios Tupinambás, extintos na época da colonização.
(*) Os Guaranis são classificados em 3 subgrupos: Mbya, Nhandeva e Kaiowa. Os Mbya tradicionalmente, são aqueles que ocupam a região litorânea. Apesar de possuírem características comuns que garantem sua unidade em relação aos demais subgrupos, eles apresentam especificidades histórico-culturais que resultam em uma auto identificação diferenciada.
Fontes:
https://fundart.com.br/tradicao/comunidades/indigenas/
https://www.cpisp.org.br/etnodesenvolvimento/html/aldeia.html
https://www.maranduba.com.br/aldeiacorcovado.htm
Livro MBA´EPU ETE´l – Instrumentos Musicais Sagrados: narrativas, confecção e uso.
(Maria Aparecida Honório e Mario Benites da Silva).