O Boi de Conchas – Ratambufe

O Boi de Conchas – Ratambufe

O “Boi de Conchas” teve seu nome de batismo Ratambufe.
Era filho do boi Marujo com a vaca Sereia, nascera no dia 29 de junho, dia de São Pedro Pescador.
Ao ver Cipriano, o bichinho deu um mugido parecendo som de Ratambufe*!
– Isso mesmo, você vai se chamar Ratambufe! Esse mugido tá parecendo o ratambufe do Domingos Anagro, batendo em dia de carnaval.
– Você é forte, bonito e tem jeito de ser um bom carreador!
– Você nasceu no dia de São Pedro Pescador, não é? Vou levá-lo para conhecer o mar! Você vai ver que beleza que é o mar! Está ouvindo Ratambufe?

O Boi de Conchas - Imagem de https://www.facebook.com/boideconchas/photos
O Boi de Conchas – Imagem de https://www.facebook.com/boideconchas/photos

O recém-nascido bezerro, parecendo que entender, fitava a promessa do velho Cipriano. Ratambufe era um boizinho quase que inteiramente branco, apenas o rabo era preto, e destacava-se uma mancha preta na testa com formato de concha. Cipriano era um tropeiro do Bairro Alto de São Luiz do Paraitinga que comercializava em Ubatuba. Descia e subia a serra semanalmente, trazendo produtos como: queijo, farinha de milho, carne seca, carne de porco e também comercializava animais como cavalo, boi, galinha, pato, cabrito e porco. Dos produtos que levava, era a farinha de mandioca, banana e principalmente o peixe seco.

Confira a história neste vídeo produzido pelo canal “Ubatuba Lente Caiçara” com o folclorista caiçara Julinho Mendes:

Ratambufe foi crescendo e ouvindo as promessas de seu dono que iria lhe mostrar o mar. O que seria o mar? O que seria as gaivotas, as conchas, os peixes, os guaroçás… que Cipriano sempre falava? Para Ratambufe o mar seria o céu, o paraíso. Dois anos se passaram e era o mais lindo animal de Cipriano; era um boi forte, robusto, inteligente e o que mais importava era seu peso. Cipriano, como bom comerciante que era, tinha na verdade outras intenções, desceria a serra com o boi, indo diretamente para o matadouro, venderia sua carne e ganharia um bom dinheiro.

– É amanhã, Ratambufe! Amanhã você vai conhecer o mar!
Assim aconteceu. No mirante da serra, no descanso do Tuniquinho, pela primeira vez Ratambufe viu o mar. Lá de cima da serra avistou aquela imensidão de águas azuis.
– Tá vendo Ratambufe? Lá é o mar, lá estão os peixes, as conchas e as sereias, é lá que mora São Pedro pescador! Falava Cipriano ao seu animal. Ratambufe parecia entender e completamente hipnotizado não tirava os olhos daquela imensidão de águas azuis que brilhava com os raios do sol.
– Caaaalma Ratambufe, você vai ver o mar de perto! Caaaalma! Fez, Cipriano, mais essa promessa a seu boi.
A descida da serra foi tranquila, por entre grotas e cachoeiras, sob as sombras de manacás e brecuíbas, ao som de arapongas e tangarás, coisas que Ratambufe, em seus dois anos de vida, nunca tinha apreciado. O animal parecia ansioso e fazia a tropa acelerar os passos.
– Caaaalma Ratambufe, está chegando, o mar não vai fugir! Alertava Cipriano.

Boi de Conchas – Tela de Jussara Guimarães
Boi de Conchas – Tela de Jussara Guimarães

Essa história de mar era papo de Cipriano… O boi sabia disso! Chegando em Ubatuba, perto da praia o boi travou as pernas e ficou olhando para o horizonte do mar, de vez em quando balançava a cabeça, parecia que estava ouvindo um som, algum canto diferente, de repente o boi, ficou alucinado, tomou a dianteira, caminhou e entrou no mar, e o que se sabe é que o bicho nunca mais apareceu. Não se sabe se morreu ou se viveu, pois nunca acharam uma parte se quer do bicho, nem couro, nem pelo, nem chifre!

A Aparição
– Olha, Malvina! Eu vi, eu juro que vi!
– Você está ficando doido, Lindolfo! Onde já se viu um boi sair de dentro do mar!?
– Você sabe que eu não bebo, Malvina! Eu vi! Eu estava tocando minha viola na beira da praia, quando apareceu aquele vulto branco. O bicho veio ao som da minha viola, veio vindo, veio vindo e ficou diante de meus olhos, no lagamá. Eu vi! O bicho era todinho coberto com conchas. Brilhava com a florescência da ardentia.
– Olha Lindolfo. Não dá para acreditar. Não dá!!!

O Boi de Conchas ressurgindo do mar
O Boi de Conchas ressurgindo do mar – Imagem de https://www.facebook.com/boideconchas/photos

– Puxe um pouco pela memória, Malvina! Você lembra daquele boi branco que o Cipriano trouxe do Bairro Alto? Você lembra o que aconteceu com o boi?
– Ouvi falar que o boi entrou no mar e morreu afogado! Pescadores do local falaram que foi um chamado de São Pedro, outros diziam que era o canto das sereias. Foi São Pedro Pescador! Foi o canto das Sereias!
– É Malvina, isso é fato comprovado!!!

O Boi de Conchas, foi uma aparição aos olhos de Zé Capão e de vovô Lindolfo, para Zé Capão o boi aparecia em suas pescarias de robalos, na boca da barra do rio Grande, e, para vovô Lindolfo, o boi aparecia toda vez que ele dedilhava sua viola aos pés da amendoeira da Praia do Cruzeiro. Acredite ou não, o Boi de Conchas aparecerá, saindo do mar toda vez que se fizer ouvir o som de viola, pandeiro ou ratambufe, ou para ver o boizinho, basta cantar sua música à beira mar: “Sonho que boi sonhava era um dia ver o mar…” e ele aparecerá dançando com o corpo repleto de conchinhas somente para quem souber enxergar.

Boi de Conchas - Julinho Mendes
O Boi de Conchas ressurgindo do mar – Julinho Mendes

*Ratambufe: Instrumento tipicamente Ubatubano, inventado pelo caiçara Domingos Anagro, nos carnavais da década de quarenta. Instrumento meio de percussão, meio de fricção; constituído de um pau de madeira roliça, onde na parte superior prendem-se chocalhos de conchas. Amarrado ao pau, estica-se um arame que passava pela boca de uma lata pregada ao mesmo pau. O som era produzido por um reco-reco de bambu que era esfregado no arame. Esse instrumento produz um som parecendo berro de bezerro com rolar de conchas em beira de lagamá.

Fontes das informações:
https://www.litoralvirtual.com.br/litoral/lenda_boideconcha.htm
https://leiturassapeca.blogspot.com.br/2011/08/lenda-do-ratambufe-o-boi-de-conchas.html
https://ciamarulhos.blogspot.com.br/2015_04_01_archive.html

Ratambufe – A lenda do Boi de Conchas – FundArt