Cachaçarias e alambiques brindam por todo o globo, cidades incorporaram a sua cultura como a vizinha Paraty. Em Ubatuba também tivemos boas e famosas cachaças: pinga Iperoig, do Sr. Toledo Pizza da Praia do Tenório, a Ubatubana, dos irmão Chieus, uma família de Piracicaba que moravam na Fazenda Velha e a cachaça Jacaré do Sr. Leovigildo Dias Vieira. Alguma Bebidas fizeram sucesso e foram cúmplices nas resoluções tomadas em rodas que decidiram nossa história.
É o caso da famosa pinga Ubatubana, dos irmãos Chieus, que sobreviveu cerca de cem anos. Para muitos esta foi a melhor cachaça já produzida e um marco na história desta cidade. “Quando batia na goela, ardia um pouco, depois descia gostosa, com aquele cheirinho de canavial. Um néctar dos deuses! Tanto da branca, quanto da amarelinha. Esta, a mais difícil de encontrar no mercado, a não ser que se comprasse direto na Fazenda Velha, da família Chieus, onde era fabricada.”
Também havia a pinga Iperoig, feita na propriedade do senhor Vladimir Toledo Pizza (Praia do Tenório), a pinga Jacaré, do senhor Leovigildo Dias Vieira e até mesmo a típica “concertada”, de sabor suave, bebida criada aqui em Ubatuba para que as mulheres pudessem acompanhar os maridos que, quando na vinda da pesca, “matavam o bicho” (bebiam a pinga). Por anos, dona Mariazinha do bairro do Itaguá e a comunidade da Praia Grande do Bonete, região sul do município, produziam tal bebida caseira, que era encontrada em algumas festas tradicionais caiçara.
Mais história da cachaça Ubatubana
Thomaz Cancer foi o idealizador da pinga Ubatubana. Nasceu em Polla (Itália) em 11/09/1882, se instalou em Ubatuba e em 1925 consta nos assentamentos da então Coletoria Federal atual Receita Federal como produtor de aguardente da famosa pinga Ubatubana. Com sua morte em 25/09/1934, um tanto precoce, sua irmã, Raphaela Cancer deu prosseguimento a produção da mesma sendo mais tarde vendida para a família Chieus também de origem italiana. Thomaz Cancer tem seu nome perpetuado em uma das ruas da Praia Grande de Ubatuba.
A senhora de óculos escuro na foto acima é Dona Raphaela Cancer irmã de Thomas Câncer e também virou nome de rua no Jardim Carolina em Ubatuba.
Curiosidade interessante
A cachaça Ubatubana ficou tão famosa que virou sinônimo de pinga. Isso mudou até a terminologia dos filhos de Ubatuba, e muitos caiçaras começaram a mencionar que Ubatubano era pinga e então começaram a mudar o gentílico para que os filhos de nossa cidade seriam cidadãos Ubatubenses e não Ubatubanos que era pinga.
Causo Caiçara – A família Chieus e o cerne da identidade Ubatubense
Os barris eram gigantes ou eu era pequeno demais, a lembrança da Fazenda Velha com seus enormes barris de Carvalho e imensos canaviais estão bem vivas em minha mente. Ali, no Alambique da Fazenda Velha os Chieus fizeram história nas terras donde outrora fora Pangeia. Além de produzir a Ubatubana, famosa água ardente “amarelinha” o Whisky Caiçara “made in Ubatuba”, uma afrodisíaca bebida que virava o “zóio” de todo mundo que ousava sorver o líquido milagroso, os “Kius’, ajudaram na discussão da identidade do povo de nossa querida Ubatuba. (Não podemos jamais esquecer que a Ubatubana era usada na produção da inigualável “Concertada”, famoso licor Tupiniquim).
Foi nesses tempos, século XX ainda, que “pras bandas” da Praça Nóbrega, no centrinho da cidade, bem do ladinho do Relógio do Sol, (“por mode” que ele derreteu de tanto calor e sumiu), uns caiçaras do norte e do sul, principiaram o feroz discussão, que mudou de século e está viva até os dias de hoje. A conversa “tava amigáve”, os caiçaras estavam felizes falando dos projetos do comendador Matarazzo, até que um desinfeliz disse: “Lhei só, pra mode que mais um UBATUBANO ta chegando pra nóis proseá”. Arrelá, o pau comeu sorto, foi um sarcero só ao redor do Relógio do Sol. Com o dedo em riste na direção do protuberante nariz do acusador, o nobre caiçara de honra ofendida disse: .”Bóis ta di provocação homi, num respeita os mais véio. UBATUBANO é cachaça, pra mode di qui sô UBATUBENSE”.
Se os antigos dizem que é verdade. quem sou eu para duvidar.
Autor: Charles Medeiros via Facebook
Histórias de um caiçara
A minha vó Martinha foi menina de engenho. “Eu trabalhava, ainda novinha, no engenho de pinga do vovô Chico Cabral”, costumava relembrar de vez em quando. “Tinham outros que também faziam pinga, mas eu não conheci. O vovô contava de um engenho admirado por ele, onde tinha uma cachaça muito bem falada. Era perto da cidade, depois do Sertão das Cotias e do Morro da Berta. O dono era um tal de Tomás ”. Passou tempo. A Praia do Pulso, onde vivera o nhonhô Chico Cabral, também foi tomada por casarões. Vovó findou seus dias no bairro da Estufa.
Na adolescência, quando comecei a trabalhar num bar, “topei” com a “mardita” Ubatubana, a substituta daquela produzida por Thomaz Cancer. Quem revendia o produto, em dúzia de litros acondicionados em engradados de madeira, era o Zezé da Antárctica, irmão do Ditinho Jati. Era cheirosa a danada! O rótulo estampava uma embarcação puxada numa prainha, tendo ao fundo uma ponta sobre o mar e morros verdejantes. Essa pinga cheirosa da nossa terra se apresentava como “branquinha” ou “amarelinha”. Os turistas faziam questão de comprar litros e litros. Diziam: “Essa é da boa!” Depois, com a chegada das aguardentes industrializadas (Riopedrense, 51, Tatuzinho etc.), foi-se a famosa Ubatubana.
Demorou tempo para que eu conhecesse melhor alguns dos Chieus, os fabricantes desse produto que, desde 1978, deixou de ser produzido ali perto da ponte da estrada do Monte Valério, na Fazenda Velha. Então, passei a alimentar um desejo: saber mais coisa, ouvir a história desse pessoal e do engenho de pinga que faz parte da memória de Ubatuba (e dos ubatubanos). Finalmente me encontrei com o Umberto Chieus, o “Nenê”. Era sábado. Conforme me garantiu o Arnaldo, seu filho: “Todos os dias, a partir das sete horas, ele já está no mato. É a rotina dele. Ele vai gostar de conversar com você a respeito da fazenda”. Assim, com uma boa disposição, quase completando os oitenta e três anos, ele contou:
O meu pai era Domingos Chieus, italiano que morava em Piracicaba. Por indicação de Alexandre Malfatti, irmão da famosa Anita, ele veio trabalhar nesta fazenda em 1928. A proprietária na época era a Francisca. O primeiro dono tinha sido o Thomaz Cancer, seu filho. [Neste momento ele mostrou a chapa de cobre vazada, usada na identificação do fabricante nos barris]. Depois, tudo passou à Raphaela Cancer. Éramos seis irmãos: Roberto, Augusto, Domingos, Gilberto, Umberto e Antônio. Só eu e o Antônio nascemos em Ubatuba. Somos caiçaras! Após a morte de nosso pai, estávamos resolvidos a deixar esta cidade porque apresentava uma mínima possibilidade de crescimento econômico. Foi quando a dona Rafaela quis vender as terras (aproximadamente duzentos hectares) para nós. A fazenda fazia parte da gente. Nós a compramos em 1952.
A área de plantação de cana ocupava cerca de vinte e cinco hectares. Equivale aos terrenos do Jardim Carolina e do Jardim Samambaia. A produção era boa. Chegamos a ter até dez trabalhadores nos bons tempos de produção, por volta de 1970. A pinga produzida aqui tinha uma boa aceitação na cidade, mas a gente também vendia para fora (São Luiz do Paraitinga e Taubaté). No tempo da safra, às quatro horas da madrugada nós já vínhamos para o engenho. A produção girava em torno de mil litros por dia. A capacidade de depósito era para mais de cento e vinte mil litros. Você imagina isso?
A entrega era feita pelo próprio engenho. O lugar mais longe, ainda lembro bem, era no armazém do Maciel, na Enseada. Duas pessoas a cavalo saíam no amanhecer. A carga seguia de cargueiro: dois burros, abarrotados de litros entre palhas, seguiam a “Trilha da Ferrovia” até o Itaguá. Depois atravessavam a Praia Grande e a Toninhas, sempre pelo lagamar. Então subiam o morrão e desciam a estrada para a praia, onde ficava o maior armazém daquele tempo. Diziam que o Maciel tinha os melhores preços. Só sei dizer que, por volta das duas horas da tarde o pessoal estava de volta, na fazenda.
A história do bagre engarrafado
Leovigildo Dias Vieira, seu Vivi como era chamado, proprietário da Fazenda Lagoa, as margens do rio Lagoa. Além do cultivo de arroz, feijão, cana-de-açúcar, mandioca, batata-doce, produzia-a farinha de mandioca, o melado, açúcar mascavo e a famosa pinga Jacaré. A fama da fazenda era por causa da pinga Jacaré, uma das melhores da região; era produto tipo exportação, levado para a cidade de Santos e de lá para outros países. A pinga era engarrafada em curiosos garrafões de cinquenta litros que eram transportados em canoas de voga para todas as cidades do Litoral Norte e Sul.
Meu pai, o conhecido Velho Rita, trabalhava na fazenda do seu Vivi. Era ele quem selecionava as canas, preparava a fermentação e fazia o principal: a degustação daquela água que passarinho não bebe. Papai tinha um carinho todo especial com os garrafões que eram trazidos para casa, em carros de bois, para serem lavados com maior perfeição, num rancho as margens do rio Acaraú, que fazia fundo para nosso quintal. Ali os garrafões ficavam esperando o dia do engarrafamento da cachaça.
Era mês de março, mês das águas. A primeira chuva que veio formou uma grande enchente no rio Acaraú. Papai dormia em sua cama de pau duro (tarimba), quando de madrugada sentiu aquela água gelada molhando-lhe as nádegas. – Que é isso? Deu um pulo e acordou assustado. Viu então que o rio tinha transbordado. Recolheu os pertences, tirou as crianças e fomos pra casa de titia, no morro do Tenório. Eu naquela época tinha uns cinco anos e dormia também em cama de pau duro. Quando acordei já tinha engolido uns oitos guarús.
A enchente durou uns oito dias; voltamos para casa e continuamos a nossa vida normal. A única anormalidade era minha barriga, que a cada dia crescia uns três centímetros. Os botões da camisa foram estourando todos. Todo mundo me achava bonitinho e gordinho. E a barriga ia crescendo…
Depois de um mês minha mãe começou a reclamar de um estranho barulho noturno que vinha de dentro do barracão. Fomos verificar tal barulho e encontramos os garrafões todos com uns bichos estranhos; eram bagres jundiás que entraram com a enchente, cresceram e não puderam sair. Tinha bagre com mais de cinco quilos. Papai improvisou um saca rolha para puxa-los, mas não deu certo, a cabeça do bicho não passava no gargalo. Quebramos os garrafões e tiramos mais de trezentos bagres, que foram distribuídos para o bairro do Itaguá inteiro, os que sobraram foram secos para serem comidos com banana madura, abóbora, cará moela ou batata-doce.
Com aquela comilança toda, além da barriga meus pés também começavam a engordar, e as pessoas falavam: – Que menino bonitinho!
Pois é! Naquele tempo os rios eram limpos e os peixes eram fartos. Minha família se alimentava dos bagres, carás, dos robalos e até das palombetas que existiam no rio. Se tem um que não me deixa mentir é o nosso amigo Bigode que cresceu comendo muçum e caranguejo-mãe-d’água do rio Indaiá, regado com as boas pingas existentes em nossa terra como por exemplo a pinga Jacaré, a Ubatubana, a Iperoig, e tantas outras; hoje ele é um exemplo de atleta, detentor de vários troféus e medalhas que conquistou nas disputas de provas pedestres e na São Silvestre.
Saudade da pinga Jacaré. Hoje a pinga é ruim e cheira álcool. Os nossos caiçaras quando tomavam uma pinguinha, diziam que era pra matar o bicho e jogavam um pouquinho para o Santo. Já pensou o mestre Bigode que está fazendo a imagem de São Pedro, se fosse tomar uma cachaça ruim dessas que tem hoje e fosse jogar um pouquinho para o Santo? O Santo ia ficar louco e lhe arrancava os fios do bigode.
Pois é! Da fazenda do seu Vivi, hoje só restam lembranças, dos bagres jundiás e de outros peixes, só mesmo em livros, se é que fotografaram. O rio Lagoa ainda se faz presente e infelizmente se transformou em uma grande fossa negra, que serve de cartão de visita para turistas. Da pinga Jacaré fica apenas este escrito, relato para os futuros filhos de Ubatuba que aqui era terra fértil, sadia e perfumada.
História da Pinga, da Cachaça e do Aguardente – Lenda ou história real?
A cana originou-se no sul da Ásia, mais foi no Brasil, que se descobriu a cachaça. Também já foi pinga e aguardente. Nas senzalas os negros mexiam o caldo-de-cana para fazer o melado, um dia cansados pararam de mexer, e caldo desandou. Esconderam o tacho, que no dia seguinte azedou e fermentou (virando álcool). Para disfarçar misturaram ao novo melado, e o álcool evaporou, já em forma de cachaça. As goteiras pingavam, e daí vem o nome de pinga, mas ao cair nas feridas dos negros ardia, e passaram então a chamar de aguardente.
Em dias difíceis perceberam que aquilo lhes deixavam alegres e repetiam o processo. Isso aconteceu em meados do séc. XVI, naquela época o caldo de cana-de-açúcar era conhecido como “Cagaça”, com o passar do tempo a aguardente foi caindo nas graças do fazendeiro que desenvolveram o processo de destilação e passou a chamar a bebida de Cachaça. O paladar encorpado ganhou as mesas da corte e em pouco tempo tornou-se moeda corrente na compra de escravizados na África. Com o passar dos tempos foi esquecida e na “Semana de Arte Moderna”, em 1922, com o modismo de resgatar a brasilidade, a cachaça retorna as mesas mais requintadas do país, um sabor refinado e indiscutível que hoje ganhou terras internacionais.
Nas Minas Gerais e Pernambuco ela tem até dia para se comemorar, 21 de maio. Hoje faz parte dos paladares mais exigentes. Cachaçarias brindam por todo o globo, cidades incorporaram a sua cultura como a vizinha cidade de Paraty. Em Ubatuba também tivemos boas e famosas cachaças: pinga Iperoig, do Sr. Toledo Pizza, a Ubatubana, dos irmão Chieus e a Jacaré do Sr. Leovigildo Dias Vieira. Um brinde a nossa bebida Brasileira.
Há distinção entre aguardente e cachaça. Aguardente é qualquer destilado de frutas, melaço de cana ou outras fontes de açúcar. Cachaça é o destilado produzido a partir da destilação direta do caldo de cana fermentado, sem passar pelo processo de cozimento. Portanto, quando feita a partir do melado, melaço ou mel, o destilado recebe o nome de aguardente.
Fonte de Informações
Parte de texto extraído da página de Facebook de Cláudia Oliveira
https://www.cachacarefazenda.com.br/pagina/historia-da-cachaca.html
https://ubatubense.blogspot.com/2015/01/fazenda-velha.html
http://www.muscai.com.br/historias/01/06.html
https://ubatubense.blogspot.com/2019/01/a-familia-chieus-e-o-cerne-da.html
https://ubatubense.blogspot.com/2020/04/familia-cancerfamilias-ubatubenses.html