As negociações aconteceram ainda no Brasil nascente. Os portugueses estavam sendo ameaçados. A Confederação dos Tamolos estava fortalecendo alianças. Após o susto em Piratininga, Nóbrega e Anchieta resolveram agir. Os Jesuítas partem de Bertioga rumo à aldeia do cacique tamolo Coaquira, em Iperoig. Em 5 de Maio de 1563 Anchieta e Nóbrega chegaram à aldeia de Iperolg. Lá chegando, foram rodeados de canoas e deram de cara com Coaquira e Pindabuçu. Os Jesuítas ouviram um rosário de queixas dos tamoios e eles propõem um acordo de paz. Coaquira hospedou os embaixadores na aldeia, que foi o sitio das negociações. Tudo parecia Ir bem quando Almberê, considerado por Anchieta o mais cruel, se posicionou contra a paz com os colonizadores. A primeira assembleia da Confederação foi tumultuada, havia multas queixas contra os portugueses: atrocidades, traições, incêndios, intrigas, capturas dos indígenas tratados a fogo e a ferro. Almberê, bravo e de voz alta pediu: “A liberdade de todos os tamoios escravizados e a entrega dos caciques que se uniram ao inimigo “pero”.
(*) Tamuya” quer dizer “o avó, o mais velho, o mais antigo”, por isso essa confederação de chefes chamou-se Confederação dos Tamuya, que os portugueses transformaram em Confederação dos Tamoios. Outra curiosidade é que a palavra tamoio usualmente é empregada da mesma forma no plural, sem o “s”.
Anchieta se pôs contra e Almberê o ameaçou com seu “tacape”. Tumultuada a sessão, nenhum acordo havia sido fechado. Aimberê tinha razões de sobra para não confiar nos portugueses, pois eles o tinham aprisionado junto a seu pai, também a sua mulher que foi feita escrava. Tudo Isto se agravava, uma vez que Anchieta traiu um segredo de confissão ao revelar o plano de ataque dos indígenas a Piratininga (São Paulo), plano este confesso por Tibiriçá, contado por seu sobrinho Jogoanhara, filho de Araraí. Jogoanhara havia visitado o tio Tibiriçá e havia lhe entregue a noticia dos confederados, através de Aimberê, que queriam a volta de Tibiriçá a seu antigo povo, com isto contou ao tio que no prazo de três luas haveria um conflito, um ataque aos portugueses. Sem paz consigo mesmo, Tibiriçá procurou o jesuíta para se confessar, lá contou da visita do sobrinho e do conflito futuro. Temendo assim perder o apostolado e a vida, Anchieta viola o segredo de confessionário. Nóbrega, com os nervos a flor da pele, propõe uma nova assembleia.
Os indígenas estavam divididos, uns eram a favor da paz, outros queriam a guerra começando pela morte dos padres. Enquanto o desfecho para a segunda assembleia não saía, o padre (abaré) José de Anchieta, num ambiente tenso e com uma guerra iminente escreve, pedindo proteção, nas areias da Praia de Iperolg, o poema a Virgem Maria, que compunha sentimentos e superstições, costumes e perfis indígenas descritos na composição de 5.902 versos (de Beata Virgine Del Mater Maria). Iniciaram-se os entendimentos, mas os indígenas, cautelosos e desconfiados, exigiam provas concretas de sinceridade por parte dos padres. Vale lembrar que como fator agravante da situação já por si só delicada, alguns franceses foram inseridos na vida tribal e na decisão do possível acordo. Os confederados, povo de muitas armas e astúcias por excelência, eram dez mil arcos com que passou o francês a contar sobre os próprios recursos, que já seriam suficientes para enfrentar os portugueses em qualquer emergência. Até então, nunca haviam sido razoáveis sequer as relações entre portugueses e tamoios. Por isso o acordo era tão importante.
O padre Manoel da Nóbrega era dotado de extraordinária visão politica. Sabia ele e com fundadas razões que o indígena insistiria no ataque. Refeito do sofrimento, reaparelhado nos seus petrechos de guerra, o indígena voltaria, para a desforra. E o faria sucessivamente, cada vez com mais raiva até que levasse o desanimo ao bloco civilizado. Era da natureza do indígena defender suas terras e suas tribos, já que não temia a morte. Sobre isso não mantinha ilusões o padre Manoel da Nóbrega. Que fazer, no entanto? Noites intermináveis de ansiedade e insônia povoavam de trágicas visões a mente do genial jesuíta, responsável, perante Deus e perante o rei. De repente, teve uma fantástica ideia, porque não tentar a paz. Pesou-lhe os prós e os contras. Amadurecida a ideia, despertou José de Anchieta, seu discípulo. Aprovado pelo discípulo o plano do mestre, puseram-se os dois a caminho de São Vicente. Empenhados sempre estiveram na luta em prol da preservação da unidade da pátria em formação, assim como os dizeres em latim do brasão de Ubatuba: Manteve a Unidade da Fé e da Pátria.
A segunda assembleia não foi fácil, Nóbrega e Anchieta ouviram muitas reclamações. Anchieta, em tom alto e calmo, falou da necessidade da paz e toda a confederação o ouviu atentamente. Anchieta dizia que realmente os tamoios eram os donos da terra e que os portugueses, aos faltarem com a lei de Deus, as condições do tratado, seriam punidos. Falou ainda que todos teriam que trabalhar como irmãos, os “pêros” fariam escolas e ajudariam com os doentes e os indígenas poderiam plantar e caçar. Almberê, ainda desconfiado continuava a exigir a libertação dos cativos e a entrega dos traidores como Tibiriçá e Caluby. A fala deste chefe recebeu apoio de todos, que deixaram os padres sem saber o que fazer. Para ganhar tempo, Anchieta concorda e diz que teriam de consultar o governador e para que isso se confirmasse, Nóbrega retornaria a São Vicente, levando Cunhambebe, enquanto Anchieta permaneceria em Iperoig como refém.
Um breve período de paz antecede a traição
As condições foram impostas por Almberê, desconfiado das intenções portuguesas. Cunhambebe resolve partir para São Vicente acompanhado de Nóbrega para certificar-se do cumprimento das reivindicações feitas. Anchieta como refém cativa a todos passando a celebrar missas diárias ensinando hinos em tupi às crianças. Os indígenas se impressionavam, pois os pássaros, pousavam no ombro do sacerdote. Uma conversa foi reproduzida por Antônio Torres, quando cativos e temendo sobre suas vidas entre os tamoio. Nóbrega havia aceitado as condições impostas pelos indígenas como um modo de atrasar a ação de ambas as partes. Nestas negociações Pindabuçu chegou com fome de matar os padres, que fugiram para uma igreja de palha. O líder indígena e Anchieta por alguns minutos se olharam. O beato tocou nos ombros do chefe e lembrou-o das glórias da tribo e que estavam ali para negociar a paz e não promover mais sangue e que ambos deveriam ter gestos nobres ante o que acontecia. Pindabuçu cede ao apelo de Anchieta. Almberê retorna para Uruçumirim, lá sua filha Potira havia dado a luz a seu neto. Ele aproveitou para consultar alguns franceses sobre a proposta dos padres. Na volta a Iperoig, Aimberé está à frente de 40 canoas com alguns franceses a bordo.
Araraí, da tribo dos Guaianases, próximo do colégio dos jesuítas em Piratininga, queria a continuidade da guerra. Ouros chefes também queriam a guerra, mas também queriam viver, mas com a garantia de serem respeitados em suas terras. Almberê se mostrou compreensivo e entendeu a necessidade da viagem e decide partir junto. Ele enfrentou com bravura as negociações em São Vicente e em Piratininga. Suas conclusões fizeram os brancos ceder aos pedidos e em troca, isto é, para selar o acordo de paz, queriam a volta do jesuíta que tinha ficado em Iperoig. Almberê desconfia dos “pêros”, discussões acaloradas transformam as negociações em caos. O jesuíta Luiz de Grã Intervém e sugere que um dos padres fosse a Piratininga e outro continuasse em Iperoig até que todas as partes se entendam.
Desta forma Manuel da Nóbrega foi escolhido para última etapa de negociações. Para Piratininga, Almberê levou seu jovem cunhado Parabuçu e um chefe Aimoré muito respeitado, Araken. A falta de noticias deixaram os confederados agitados em Iperoig, aumentando as hostilidades entre os tamolo e o jesuíta, que não foi morto por Intervenção de Cunhambebe e Coaquira. Nóbrega foi então levado para o centro das negociações. De São Vicente desembarcou em Bertioga (Buriquioca), de lá foi a Piratininga. Nóbrega que estava doente se recuperou e selou o acordo de paz entre Almberê e as autoridades portuguesas. Diante do acordo as autoridades portuguesas mandaram expedições de soldados às fazendas para libertar os cativos, todos acompanhados por Almberê. Na realidade Aimberê estava à procura do amor de sua vida, a jovem Iguaçu, que não foi encontrada na fazenda de Eliodoro Eoban.
Triste e desconsolado Almberê retorna a Iperoig, lá viu obras realizadas por Anchieta como agricultura e pecuária. Com Isto ganhou respeito da tribo de Coaquira. De volta a sua aldeia, Almberê é recebido com festa, mas festa mesmo foi quando descobriu que Potira o aguardava, ela havia sido resgatada por seus amigos, capturando seus raptores, antes que ele tivesse chegado à fazenda de Eliodoro. Anchieta volta a São Vicente com a escolta de nada mais nada menos que Cunhambebe, chefe da confederação mais famosa das Américas. Cunhambebe mandou soltar todos os cativos nas aldeias e retornando a sua aldeia fez um balanço positivo do Tratado da Paz de Iperoig, em 14 de setembro de 1563.
Um breve período de paz aconteceu após a “assinatura” do tratado. Porém, tudo que é bom dura pouco e um ano depois das negociações, os portugueses romperam o acordo, voltando a sujeitar os indígenas capturados a trabalhos escravizados, com isso a guerra começou onde tinha acabado um ano antes, em Iperoig. Lá houve a invasão das duas aldeias de Coaquira, que foi morto. Depois destruíram as de Araraí. Os portugueses não só escravizavam para os engenhos, mas também para as expedições de ouro. Anchieta por determinação da Coroa muda seus interesses, e inflama o governador geral do Brasil, Mem de Sá na sua empreitada de retomar seus interesses patrimoniais. O governador cria o Comando das Operações de Extermínio dos Confederados, de forma a liquidar o poder que os indígenas haviam conquistados de forma diplomática.
No dia 8 de janeiro de 1567, com o reforço de três galeões vindos de Portugal e dois navios de guerra bem armados, Mem de Sá deu inicio a chacina. A matança foi encerrada no dia 20 de janeiro do mesmo ano, dando por fim a cruzada contra os indígenas. Ao que se sabe, os tamoio nunca cederam à quebra do tratado, mantiveram-se fiéis ao que tinha sido acordado com os “pêros” e aos “mairs” franceses que mantinham um melhor relacionamento com os indígenas do litoral.
Mem de Sá, que solicitou a intervenção de um tratado, massacrou os indígenas, os mesmos que foram considerados os “Filhos da Terra”, que eram homens destemidos, indomáveis na guerra, mas de palavra, sensíveis às negociações, compreensivos no trato dos acordos. O massacre é pouco divulgado, mas quem procura saber da história descobre a traição dos “pêros”. O Tratado de Paz passou a figurar na história do Brasil como a “Paz de Iperoig”, o primeiro tratado de Paz das Américas e o primeiro trabalho de acordo concluído em terras americanas, que assim pode ser entendida na iniciativa de seu destino histórico: marco Inicial da generosa política brasileira de resolver pendências através de tratados, na mesa, no caso especifico na Oca das conferências.
Fonte das informações:
Ezequiel dos Santos – Jornal “Maranduba News”